Mapear os significados contestados da identidade nacional angolana através da literatura pós-colonial

Carolina Barros Tavares Peixoto

Resumo


Resumo: O romance histórico Yaka, de Pepetela, narra o último século de administração portuguesa em Angola e as múltiplas resistências das populações nativas à ocupação colonial até a conquista da independência. Na construção da nação angolana, o pano de fundo do romance, uma narrativa sutil surge nas entrelinhas. Esse espaço liminar de representação articula as dificuldades de definição do que se tornaria representativo de uma ideia, ou um ideal, de “angolanidade” que foi construída concomitantemente à projeção da nação. A complexidade do enquadramento político e cultural que definiria a identidade nacional angolana decorre das experiências da história colonial, que, mais do que (re)inventar as fronteiras do que viria a ser a geografia política do país em busca da independência, teve um papel fundamental na definição do que constituiria o povo angolano – seja colocando juntos diferentes povos que originalmente habitaram esse vasto território, ou pelo assentamento de uma quantidade significativa de colonizadores brancos nos espaços conquistados. Depois de tantos anos de histórias e memórias compartilhadas entre colonizadores e colonizados, que características seriam consideradas como fontes legítimas de pertencimento nacional? Que fronteiras demarcaram a “angolanidade” funcionando como base para a construção da identidade nacional angolana? Quem teria direito à cidadania após o processo de independência? Estas questões orientaram o presente estudo de caso, que, ao ler Yaka como um romance histórico constitutivo das narrativas angolanas de pertencimento elaboradas já em uma conjuntura pós-colonial, reflete sobre os processos de exclusão/inclusão da população não negra na construção de uma ideia ou ideal de “angolanidade”.

Palavras-chave: Pepetela; angolanidade; pertencimento; identidade nacional.

Abstract: Pepetela's historical novel Yaka narrates the last century of Portuguese colonial presence in Angola and the multiple forms of resistance of native populations to colonial occupation until the conquest of independence. In the construction of the Angolan nation, the background of the novel, a subtle narrative appears between the lines. This liminal space of representation articulates the difficulties of defining what would become representative of an idea or an ideal of “Angolanity” that was constructed concomitantly with the projection of the Nation. The complexity of the political and cultural framework that would define Angolan national identity stems from the experiences of colonial history, which, more than (re)inventing the borders of what would become Angolan political geography, played a fundamental role in defining what would constitute the Angolan people – by putting together different peoples who originally inhabited this vast territory, or by the settlement of a significant population of white settlers in the conquered spaces. After so many years of stories and memories shared between colonizers and colonized, what characteristics would be considered as legitimate sources of national belonging? What frontiers demarcated the “Angolanity”, functioning as a basis for the construction of Angolan national identity? Who would have the right to citizenship after the independence process? These questions guided the present case study which, reading Yaka as a historical novel constitutive of the Angolan narratives of belonging elaborated in a postcolonial conjuncture, reflects on the processes of exclusion/inclusion of the non-black population in the construction of an idea or ideal of “Angolanity”.

Keywords: Pepetela; angolanity; belonging; national identity.


Palavras-chave


Pepetela; angolanidade; pertencimento; identidade nacional; angolanity; belonging; national identity.

Texto completo:

PDF

Referências


BATSÎKAMA, P. Angolanidade: construção das identidades angolanas, Por dentro da África, [S.l.], 10 set. 2013. Cultura. Disponível em: http://www.pordentrodaafrica.com/cultura/angolanidade-construcao-das-identidades-angolanas-por-patricio-batsikama. Acesso em: 18 set. 2018.

BENDER, G. J. Angola under the Portuguese: The Myth and the Reality. Berkeley: University of California Press, 1978.

BHABHA, H. K. O local da cultura. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2007.

CARREIRA, S. de S. G. Narrar a nação: um projeto além da utopia. In: CONGRESSO LUSO-AFRO-BRASILEIRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS.

, 2004, Coimbra. Anais... [S.l.]: [s.n.], 2004, Disponível em: https://www.ces.uc.pt/lab2004/pdfs/ShirleyCarreira.pdf. Acesso em: 19 maio 2011.

FIGUEIREDO, L. Luanda 1974/1975: o Movimento Estudantil. Óbidos: Sinapis, 2012.

GILROY, P. O Atlântico Negro: modernidade e dupla consciência. São Paulo: Editora 34; Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes, Centro de Estudos Afro-Asiáticos, 2001.

HALL, S. As culturas nacionais como comunidades imaginadas. In:______. A identidade cultural na pós-modernidade. Rio de Janeiro: DP&A, 2006. p. 47-65.

HALL, S. Quem precisa da identidade?. In: SILVA, T. T. da (Org.). Identidade e diferença: a perspectiva dos estudos culturais. Petrópolis: Vozes, 2005. p. 103-133.

MAMA, A. Is It Ethical to Study Africa? Preliminary Thoughts on Scholarship and Freedom, African Studies Review, Cambridge, New York, v. 50, n. 1, p. 1-26, 2007.

MEMMI, A. Retrato do colonizado precedido pelo retrato do colonizador. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.

PADILHA, L. C. O Sapalalo ou uma casa entre dois mundos em Benguela. In: . Novos pactos, outras ficções: ensaios sobre literaturas afro-luso-brasileiras. Lisboa: Novo Imbondeiro, 2002. p. 71-82.

PEIXOTO, C. B. T. Ser, não ser, voltar a ser ou tornar-se? Uma reflexão sobre a (re)inserção social dos angolanos de ascendência portuguesa à luz dos estudos pós-coloniais. 2015. 320 f. Tese (Doutorado em Pós-colonialismos e Cidadania Global) – Faculdade de Economia, Universidade de Coimbra, Coimbra, 2015.

PEPETELA. “O Escritor é um ditador no momento da escrita”. União dos Escritores Angolanos, Luanda, [201-?]. Entrevistas. Entrevista concedida a Aguinaldo Cristóvão. Disponível em: http://www.ueangola.com/ index.php/entrevistas/item/384-o-escritor-%C3%A9-um-ditador-no-momento-da-escrita.html. Acesso em: 19 maio 2011.

PEPETELA. Yaka. Alfragide: D. Quixote, 2010.

QUIJANO, A. Colonialidade do poder e classificação social. In: SANTOS, B. de S.; MENESES, M. P. (Org.) Epistemologias do Sul. Coimbra: Almedina, 2009. p. 73-117.

RIBEIRO, G. A vertigem da descolonização: da agonia do êxodo à cidadania plena. Mem Martins: Editorial Inquérito, 2002.

SANTOS, A. Quase memórias. Braga: Círculo de Leitores, 2006. v.1. SANTOS, B. de S. A gramática do tempo: para uma nova cultura política.

ed. São Paulo: Cortez, 2008.

SANTOS, B. de S. Entre Próspero e Caliban. Colonialismo, pós-colonialismo e inter-identidade. In: RAMALHO, M. I.; RIBEIRO A. S. (Org.). Entre ser e estar: raízes, percursos e discursos da identidade. Porto: Afrontamento, 2002. p. 23-85.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2238-3824.23.3.83-98

Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Direitos autorais 2018 Carolina Barros Tavares Peixoto

Licença Creative Commons
Este obra está licenciado com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.