Literatura e Retórica na Institutio oratoria de Quintiliano e no Supremo Tribunal Federal brasileiro

Charlene Martins Miotti, Wagner Silveira Rezende

Resumo


Resumo: Este trabalho tem por objetivo apontar semelhanças entre alguns recursos argumentativos dos juízes do Supremo Tribunal Federal brasileiro e os preceitos de Quintiliano no sexto livro da Institutio oratoria quanto à manipulação das emoções do auditório e ao emprego de excertos literários em discursos forenses. Para tanto, compara-se seis citações diretas da Eneida de Virgílio, usadas pelo antigo rétor para ilustrar algumas estratégias de persuasão bem sucedidas, aos votos de cinco juízes em três hard cases recentes que atraíram muita atenção midiática: a ADI 3510 (lei de biossegurança sobre pesquisa com células- tronco), a ADI 4277 (reconhecimento da união homoafetiva) e a ADPF 54 (descriminalização do aborto em casos de nascituros diagnosticados com anencefalia). A comparação parece oportuna para demonstrar a atualidade e a circulação de um modus operandi retórico já discutido e aceito pelos antigos, mas que, modernamente, engendra certa ameaça ao mito do Direito imparcial e objetivo.

Palavras-chave: Literatura; Retórica; Quintiliano; Institutio oratoria; Supremo Tribunal Federal.

Abstract: This paper aims to point out similarities between some argumentative resources from Brazilian Supreme Court’s judges and Quintilian’s precepts in the sixth book of Institutio oratoria concerning handling the emotions of an audience and the usage of literary excerpts in forensic speeches. Therefore, we compare six direct quotes from Virgil’s Aeneid, used by the ancient rhetorician to illustrate some successful persuasion strategies, to five judges’ votes in three recent hard cases that attracted much media attention: ADI 3510 (biosafety law on stem- cells), ADI 4277 (recognition of homoaffective union) and the ADPF 54 (decriminalizing abortion in case of unborn diagnosed with anencephaly). The comparison seems appropriate to demonstrate the topicality and the circulation of a rhetorical modus operandi already discussed and accepted by ancient authors, that modernly, however, engenders a certain threat to the myth of impartial and objective Law.

Keywords: Literature; Rhetoric; Quintilian; Institutio oratoria; Brazilian Supreme Court.


Palavras-chave


Literatura; Retórica; Quintiliano; Institutio oratoria; Supremo Tribunal Federal

Texto completo:

PDF

Referências


ARISTÓTELES. Poética. Trad. Ana Maria Valente. 3a ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 2008.

ARISTÓTELES. Retórica. Trad. Manuel Alexandre Júnior, Paulo Farmhouse Alberto e Abel do Nascimento Pena. Lisboa: Imprensa Nacional, 1998.

BARTHES, R. L’ancienne rhétorique [Aide-mémoire]. In: BARTHES, R. (org.). Communications, 16 (Recherches rhétoriques). Paris: Seuil, 1970, p. 172-223.

BOURDIEU, P. O poder simbólico. 16ª edição. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2012.

CICERO. De inuentione; De optimo genere oratorum; Topica. With an English translation by H. M. Hubbell. Cambridge: Harvard University Press, 1949.

DODDS, E. R. Os gregos e o irracional. Trad. Paulo Domenech Oneto. São Paulo: Escuta, 2002.

DUBOIS, J. et. alii (grupo μ). Retórica da poesia: leitura linear, leitura tabular. Trad. Carlos Felipe Moisés. São Paulo: Cultrix, Editora da Universidade de São Paulo, 1980.

DWORKIN, R. Levando os direitos a sério. São Paulo: Martins Fontes, 2002.

HALL, J. Cicero and Quintilian on the oratorical use of hand gestures. Classical Quarterly, Cambridge, vol. 54 n. 1, 2004, p. 143-160.

LEIGH, M. Quintilian on the Emotions (Institutio Oratoria 6 Preface and 1-2). The Journal of Roman Studies, Cambridge, vol. 94, 2004, p. 122-140.

MAGALHÃES, R. F. Racionalidade e retórica: teoria discursiva da ação coletiva. Juiz de Fora: Clio Edições Eletrônicas, 2003.

MEDINA, P. R. de G. Direito processual constitucional. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005.

MEYER, M. A retórica. São Paulo: Ática, 2007. PERELMAN, C. Retóricas. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da argumentação: a nova retórica. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

QUINTILIANO. Istituzione oratoria. Ed. Simone Beta & Elena D’Incerti Amadio. Milão: Mondadori, 1997.

REZENDE, A. M. de. Rompendo o silêncio: a construção do discurso oratório em Quintiliano. Belo Horizonte: Crisálida, 2010a.

REZENDE, W. S. A retórica e o Supremo Tribunal Federal: o papel da argumentação na corte brasileira. 2010b. 196 f. Dissertação de mestrado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora, 2010b.

REZENDE, W. S. As relações entre direito, política e sociedade: retórica e teoria da ação na análise da argumentação em casos difíceis no Supremo Tribunal Federal brasileiro. 2014. 523 f. Tese de doutorado. Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais da Universidade Federal de Juiz de Fora, 2014.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/1983-3636.11.2.47-70

Apontamentos

  • Não há apontamentos.


Direitos autorais 2016 Charlene Martins Miotti, Wagner Silveira Rezende



Nuntius Antiquus
ISSN 2179-7064 (impressa) / ISSN 1983-3636 (eletrônica)

Licença Creative Commons
Esta obra está licenciada com uma Licença Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional.