O padrão discursivo barretiano da obra Clara dos Anjos e a possibilidade dessa releitura contemporânea

Adriana Reis Silva

Resumo


O presente estudo objetiva mostrar o padrão discursivo racial na produção da obra Clara dos Anjos (1922) de Lima Barreto em contraposição a essa releitura a telenovela Fera ferida (1993), de Aguinaldo Silva, Ricardo Linhares e Ana Maria Moretzsohn. Para constituir o aporte teórico estabelecido nesse trabalho, utilizamos a noção de formação discursiva segundo Michel Pêcheux (1997), buscando apreender, como a macroesturação enunciativa dos objetos Clara dos Anjos e Fera ferida se articulam através da perspectiva do dizer racial brasileiro. Parece-nos, que nesse sentido a filiação discursiva dos autores têm a capacidade de reproduzir a veleidade racial brasileira, legitimando o mito da democracia racial e o posicionamento imposto pela classe dirigente, que preza o domínio de vida capitalista. Contudo, a obra de Barreto ressignifica a óptica racial por meio da criação de “uma literatura social politicamente militante, voltada para a urgência do cotidiano em mudança e ao mesmo tempo inspirada na redenção do homem e na defesa do trabalhador oprimido pelas distorções sociais”. (PRADO, 1980, p. 13). De forma divergente, a narrativa Fera ferida mostrará, em sua trama, a desconstrução dos discursos produzidos sobre o negro, perspectiva que distorce a racialidade e, consequentemente, demanda uma nova ordem, como a criação de leis que se interpõem de forma a rever a questão racial.

This study aims to show the racial pattern in the discursive production of Clara dos Anjos (1922), work of Lima Barreto in contrast to that rereading the soap opera Fera Ferida (1993), written by Aguinaldo Silva, Ricardo Linhares and Ana Maria Moretzsohn. Constituting the theoretical framework established in this work, we use the notion of discursive formation according to Michel Pêcheux (1997), seeking to understand, as the macrostructure enunciation of objects Clara dos Anjos and Fera Ferida articulate through the perspective of the Brazilian racial say. It seems to me that, in that sense the discursive affiliation of authors has the ability to play the Brazilian racial whim, legitimizing myth of racial democracy and the position imposed by the ruling class, which values the capitalist life domain. However, the work of Barreto resignifies racial optical through the creation of “a politically militant social literature, focused on the urgency of change in everyday and at the same time inspired by the redemption of man and the defense of the oppressed worker by social distortions.” (PRADO, 1980, p. 13). In different ways, the Fera Ferida narrative shows in its plot, the deconstruction of discourses produced on black, perspective that distorts raciality and therefore demand a new order, such as the creation of laws that stand in order to review the racial issue.


Palavras-chave


Formação discursiva; Racialidade; Discurso.

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DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2238-3824.20.2.115-140

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