Narrativas de moradores de rua nas mídias sociais

Dylia Lysardo-Dias

Abstract


Resumo: Este artigo pretende mostrar como os moradores de rua expõem sua trajetória de vida por meio das diferentes formas de expressão autobiográfica instauradas nas e pelas mídias sociais digitais. Discute-se o uso das novas tecnologias da web por moradores de rua, que, através das redes sociais, registram um modo de habitar o espaço social e se fazem visíveis na e para a sociedade que os marginaliza. Utiliza-se como aporte teórico-metodológico a Análise do Discurso de linha francesa na sua articulação com os Estudos Culturais no intuito de indicar como sites, blogs e páginas de Facebook, na diversidade de configuração multimodal que exploram, têm se revelado um espaço de manifestação de várias categorias de subalternos (SPIVAK, 2010), que, ao testemunharem sua forma de existência, reorganizam o vivido, oferecendo um entendimento das suas condições de existência. Foi realizado estudo exploratório de narrativas de moradores de rua, considerando-se como os eventos narrados participam de uma sequencialidade e temporalidade que caracterizam as textualidades autobiográficas. Concebidas como uma “reconstrução discursiva” (GUILHAUMOU, 2004), essas narrativas traduzem uma presença social e indicam movimentos de alteridade inerentes ao processo de biografização de si. Os resultados sinalizam a relação do testemunho individual com a história coletiva, pois ele participa da construção de uma memória plural. Cada narrativa classifica e, de alguma forma, situa os acontecimentos axiologicamente dentro de uma dada causalidade e no interior de um circuito enunciativo, o qual coloca o sujeito que se autobiografa como personagem nuclear.

Palavras-chave: narrativas autobiográficas; moradores de rua; espaço digital.

Abstract: This paper shows how homeless people represent themselves when invited to tell their life trajectory using different autobiographic tools available in digital social media. We discuss the use of new web technologies by homeless people who, through social media, record a way to occupy the social space and make themselves visible to the society that excludes them. The methodological referential of the French concept of discourse analysis combined with Cultural Studies was used. We aimed at indicating how websites, blogs and Facebook pages have become a space to display categories of subalterns (SPIVAK, 2010) by exploring a diversity of multimodal settings. When these categories of subalterns report their way of existence, they reorganize life experiences and explain their conditions of existence. We report an exploratory study of narratives of homeless people taking into account how the narrated events fit in a sequential and temporal flow that characterizes autobiographical textualities. These narratives, conceived as “reconstruction of the discourse” (GUILHAUMOU, 2004), translate a social presence and indicate otherness movements inherent to the autobiographical process. The results indicate a relation between individual report and collective history, as the individual participates in the construction of a plural memory. Each narrative classifies and, in a certain way, axiologically places the happenings inside a given causality and in an enunciatory circuit that places the autobiographer as a central character.

Keywords: Autobiographic Narratives; Homeless People; Digital Space.


Keywords


Autobiographic Narratives; Homeless People; Digital Space.

References


AMOSSY, R. L’argumentation dans le discours. Discours politique, littérature d’idées, fiction. Paris: Nathan, 2000.

ARFUCH, L. O espaço biográfico: dilemas da subjetividade contemporânea. Rio de Janeiro: EdUERJ, 2010.

BURRY, M. Chronic illness as biographical disruption. Sociology of Health and Illness, Wiley Online Library, v. 4, n. 2, p. 167-182, 1983.

CASILLI A. Les liaisons numériques. Vers une nouvelle sociabilité? Paris: Seuil, 2010.

DAMASIO, A. R. Spinoza avait raison. Joie et tristesse, le cerveau des émotions. Paris: Odile Jacob, 2003.

DELORMAS, P. De l’autobiographie à la mise en scène de soi. Le cas Rousseau. Paris: Édtions Lambert-Lucas, 2013.

DOUBROVSKY, S. Les points sur les “i”. In: JEANNELLE, J. L.; VOLLET, C. (Dir.). Genèse et autofiction. Louvain-la Neuve: Bruylant-Academie, 2007. p.7-37.

GASPARINI, P. La tentation autobiographique: de l’Antiquité à la Renaissance. Paris: Seuil, 2013.

GUILHAUMOU, J. Un récit construit ensemble. In: GUILHAUMOU, J.; MÉSINI, B.; PELEN, J.-N. Résistances à l’exclusion: récits de soi et du monde. Aix-en-provence: Publications de L’Université de Provence, 2004. p.268-301.

KERBRAT-ORECCHIONI, C. Les interactions verbales. Paris: Armand Colin, 1990. v.1.

LEJEUNE, P. Le pacte autobiographique. Paris: Ed. du Seuil, 1975.

LICOPPE, C. Les formes de la présence. Révue Française des Sciences de l’Information et de la Communication. En ligne. Disponível em: http://rfsic.revues.org/142. Acesso em: 1 juil. 2016.

LYSARDO-DIAS, D. Provérbios que são notícia: uma análise discursiva. 2001. 276f. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) - Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2001.

LYSARDO-DIAS, D. O fazer biográfico: questões em torno do sujeito e da enunciação. In: ROCHA JÚNIOR, A. F. da (Org.). Narrativas (auto)biográficas: literatura, discurso, teatro. São João del-Rei: Ed. da UFSJ, 2014. p.63-74.

LYSARDO-DIAS, D. Posicionamento argumentativo e memória discursiva em perfis autobiográficos. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE ESTUDOS SOBRE DISCURSO E ARGUMENTAÇÃO, 3., 2016, Aracaju. Anais... Aracaju: UFS, 2016. p. 1206-1217.

MARCUSCHI, L. A.; XAVIER, A. C. Hipertexto e Gêneros Digitais: novas formas de construção do sentido. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005.

OCHS, E. Ce que les récits nous apprennent. Semen, Presses Universitaires de France, v. 37, 2014. Disponível em: http://semen.revues.org/9865. Acesso em: 26 nov. 2015.

OROFIAMMA, R. Les figures du sujet dans le récit de vie en sociologie et en formation. Informations Sociales, Cairn.Info, v.145, n. 1, p. 68-81, 2008.

PAVEAU, M.-A. Interdiscours et intertexte. In: LINGUISTIQUE ET LITTÉRATURE: CLUNY, 40 ANS APRÈS, 2008, Besaçon. Actes... Besançon, França: Université de Franche-Comté, 2010. p.93-105.

PAVEAU, M.-A. Que veut dire travailler en analyse du discours en France en 2011? Épistémologies, objets, méthodes. In: ENCONTRO INTERNACIONAL DE ESTUDOS DA LINGUAGEM, 3., 2011, Pouso Alegre - MG. Anais do Enelin... Pouso Alegre: UNIVÁS, 2012.

PAVEAU, M.-A. Une linguistique symétrique pour penser le discours. La pensée du discours [carnet de recherche]. Disponível em: http://penseedudiscours.hypotheses.org/?p=95. Acesso em: 14 abr. 2015.

SANTOS, B. de S. A gramática do tempo: para uma nova cultura política. São Paulo: Cortez, 2006.

SPIVAK, G. C. Pode o subalterno falar? Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 2010.

WALTY, I. L. C. Corpus rasurado: exclusão e cânone na narrativa urbana. Belo Horizonte: Editora da PUC Minas; Autêntica, 2005.

WIEVIORKA, A. L’ère du témoin. Paris: Plon, 1998.




DOI: http://dx.doi.org/10.17851/2237-2083.24.3.989-1013

Refbacks

  • There are currently no refbacks.
';



Copyright (c) 2016 REVISTA DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

Creative Commons License
This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.

e - ISSN 2237-2083 

License

Licensed through  Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional